A MÁQUINA DE LEIS QUE REVELA UM SISTEMA SOENTE
A MÁQUINA DE LEIS QUE REVELA UM SISTEMA SOENTE
Quando um sistema perde sua capacidade de aplicar o que já está escrito, ele começa a criar leis sobre leis, camadas de verniz jurídico para esconder falhas profundas.
Nos últimos anos, vemos isso em vários exemplos: projetos que criam novos tipos de “fake news” apesar de já existirem crimes de calúnia, difamação, estelionato e indução ao erro; propostas para criminalizar discursos de ódio quando a legislação sobre injúria racial, preconceito e incitação ao crime já cobre o tema; leis sobre violência contra a mulher que, embora importantes, muitas vezes repetem disposições já previstas no Código Penal; ou ainda regras “novas” sobre crimes cibernéticos que apenas reembalam condutas já punidas como fraude, estelionato e invasão de dispositivo.
Esse excesso normativo não reforça a justiça, ele a dilui. Em vez de aplicar com rigor as leis existentes, o sistema prefere criar textos novos, como se cada rótulo diferente resolvesse o problema que a própria máquina pública se recusa a enfrentar.
O resultado é um ambiente confuso, em que múltiplas leis disputam o mesmo espaço, enfraquecendo a clareza jurídica e criando brechas para interpretações convenientes.
No fundo, legislar demais é admitir que não se sabe governar. É tentar consertar a ferrugem da estrutura com tinta fresca, enquanto a corrosão avança por dentro, silenciosa, revelando um sistema que cria normas para não ter que encarar sua própria ineficiência.
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